terça-feira, 5 de março de 2013

Vinte dias na Costa Rica

As viagens são uma violência. A pessoa se vê forçada a confiar em estranhos e a perder de vista todo o conhecido aconchego do lar e dos amigos. Vive em constante incerteza. Nada lhe pertence a não ser o essencial – o ar, o sono, os sonhos, o mar, o céu – tudo o que se aproxima do eterno ou do que dele imaginamos. Cesare Pavese.






 Em viagem – não sem razão viagem é metáfora gasta para significar vida - , cada pessoa terá sua experiência, que resulta menos  do lugar em si e mais de como a pessoa organizou a viagem e/ou de como a pessoa é. Minha experiência da Costa Rica tem um pouco a ver com o que li de outros viajantes, mas mais do que nós próprios vivemos. Também é válido para qualquer lugar que as vivências de um não se repetem com outro: o que se capta, o que se seleciona e o que se provoca na relação com os lugares e seus habitantes variam enormemente.






  • PORTO ALEGRE – ? 

 Começamos mal a viagem em dezembro de 2013, porque a Copa Airlines precisou alterar o voo de Porto Alegre ao Panamá, inserindo um trecho Porto Alegre-São Paulo, mas esqueceu de emitir os bilhetes, e então chegamos ao aeroporto com planos, apreensões e malas, mas tivemos que voltar para casa com o mesmo carregamento, com planos a serem mudados antes mesmo de começarem e apreensões confirmadas. Só para os cães e gatos, o retorno à casa pareceu normal.
Ao final, ganhamos um dia de hotel chic no Panamá por conta da Copa. Não que isso tenha acontecido sem mais: foi preciso uma hora de telefonemas, discussões e ameaças. Apelamos até mesmo a consequências diplomáticas (das quais muito rimos porque elas nunca passariam de...nenhuma) para a má vontade do funcionário que se chamava Natanael Rocha. Já a TAM, que não tinha qualquer responsabilidade, nos dispensou toda a assistência a seu alcance (por certo, menos uma política de empresa e mais iniciativa individual).
 


  • VACINA OBRIGATÓRIA. 

 É por causa da passagem pelo Panamá (já que não há voo direto para a Costa Rica) que é preciso tomar a droga de vacina contra febre amarela. Então, com antecedência mínima de dez dias, vai-se a um posto furar o braço e depois ainda é necessário validar na Anvisa, o que se pode fazer, em Porto Alegre, no posto do Aeroporto ou no do Cais do Porto.

  • PANAMÁ 

Mesmo como “convidados” da Copa, tivemos encrenca com o funcionário da imigração, que não conhecia o hotel para onde declaramos ir. Foi preciso a funcionária da COPA ser chamada.
Um dia de Panamá não significa absolutamente nada e portanto nada tenho a dizer, a não ser que nunca tinha visto tanta gente fazendo fila em um shopping popular (estávamos em vésperas de natal). Era uma massa absurda e ainda maior do que a que invade a Expointer no domingo da maldita feira ou das turbas de bestas-feras que vão a jogos de futebol).
Também lá há muitos dos ônibus "de focinho", alguns dos quais bem coloridos, chamados diablos rojos. Como - e o que - os motoristas enxergam de dentro daquela pintura que cobre até a frente é coisa que só o diablo entende.

(ônibus diablo rojo e hotel-cassino da Copa Airlines)
 



  • COSTA RICA 




 

  • RIO CHIRRIPÓ 

 O primeiro destino foi uma região de montanhas, a Rio Chirripó e ficamos no hotel de mesmo nome.
Para escutar a natureza, é um bom começo. Não para viajar à noite como fizemos, pois a estrada, mesmo asfaltada, não é um paraíso, a menos que o paraíso seja um breu cheio de curvas e neblina. Havia momentos em que não tínhamos a menor certeza de onde a estrada tinha ido parar. Por coincidência ou sorte, ela esteve sempre à nossa frente.
 A recomendação do casaquinho para uso nas montanhas não é exagero de mãe. Durante o dia, faz calor, dá até para tomar banho no rio e nas cascatas. Os acolchoados que desprezamos na chegada foram abençoados durante a madrugada.
O silêncio é silencioso.
Na nossa segunda noite no hotel, João cozinhou na maravilhosa cozinha, os donos foram dormir e nós apagamos a luz.

Nas sacadas para as quais dão os quartos, há sofás muito confortáveis, que pegam o sol da manhã e dão vista para a montanha.
Uma segunda dica além do casaquinho é lanterna.
 Esse hotel, integrado à montanha, é bastante recomendável para tranquilidade, descanso, fruição, massagens holísticas, trilhas, etc etc. Tem piscina de água quente, de água gelada, yoga. As pessoas são igualmente tranquilas e simpáticas, e os gatos visitam os quartos, ou somos nós que invadimos seus quartos.

 






  DRAKE BAY – PENÍNSULA DE OSA

 A região sul da Costa Rica é menos visitada por falanges de turistas, o que é compreensível pela condição das estradas. Desculpem, moradores, mas tomara as estradas continuem esburacadas. É bem verdade que os viajantes mais chics chegam em pequenos aviões, já que do tempo dos Contra, sobraram pequenos campos de pouso em algumas regiões da CR.

Nesta região, desconhecidos praticam a civilizada prática de saudar-se. Pode ser a forma local de cumprimento Pura Vida (o “d” quase some na pronúncia) ou hola, buenos días e os correspondentes em outras línguas, mas sobretudo e muito sobretudo em inglês. Quase todos os ticos e ticas com quem cruzamos eram bi-língues.


O hotel Pirate Cove em Drake tem bangalôs de frente para o mar, com sacadas e rede. Há alguns caiaques que pesam uma tonelada, com uso franqueado ao hóspede que tiver disposição para o levar pela larga faixa de areia. O passeio de caiaque pela Baía Drake vale a pena (ler mais sobre “Vale a Pena” adiante), ás águas são calmas, tépidas e muito limpas.

 

O restaurante do hotel é mais caro do que bom, o café é mais ou menos, e a gerente é nervosinha. Como só tínhamos reserva para um dia, era preciso que desocupássemos a habitacion até o meio dia e parece que eles temiam que fincássemos raízes verde-amarelas. Bom, eles não estavam tão errados, porque a rigor não estávamos encontrando hotel em Drake e nem contato ou ideia de possíveis hoteis no fim da península, junto ao Parque Corcovado, boas horas de estrada de chão batido.
Porque ninguém tinha escrito um blog como esse, não sabíamos da existência do "hotel do Pablo" (adiante - Catappa), no qual poderíamos ter ficado mais tempo em total encantamento. Bom, mas perguntando no Manolo Hotel sobre possibilidades de espacio em algum lugar, soubemos que sua irmã, Mauren, tinha vagas nos dois quartos de sua casa. A primeira impressão deles foi meio assim. Os quartos são espaçosos, mas sem janelas com vista para as maravilhosas paisagens costa-riquenhas. Bobagem. Foi uma ótima experiência ficar numa casa local. A mãe de Mauren cultiva um lindo jardim e ervas e verduras em hidroponia, a casa fica em meio à vegetação natural e cultivada e o capricho é a marca da casa. Há paninhos em todos os eletrodomésticos e onde houver espaço para um paninho, até na tampa do vaso. Ela também lava roupas, empresta cafeteira e liquidificador, e dá informações turísticas. Mauren estuda Serviço Social e, nesse período, estava substituindo a mãe que tinha saído de férias.

(Nosso apartamento na Mauren e a prática de Watching Bird/ Península Drake)

 
Nestes dias, comemos em casa (os quartos têm direito a uma cozinha) até mesmo tapioca feita com almidon de yuca, uma mandioca local, usada com muita parcimônia, pois os saquinhos são de cem gramas. Para fazer poucas tapiocas, acabamos com o estoque do mini-super-mercado (os mini também se chamam super).

Nos inscrevemos para o canopy, experiência traumatizante e fascinante de andar por cima das árvores e às vezes até entre algumas árvores, ou seja, para não bater nelas, pensa-se que é necessário se encolher. Não deve ser, mas a esperança de trombar numa árvore e despencar 50 metros é o que justifica este passeio aéreo.

Estava tão apatetada, uma vez que um lance de escada vazada já costuma me dar pânico, que não ouvi a parte da explicação que dizia onde não se deveria frear e que frear era apertar a mão direita no cabo pelo qual se desliza. O pobre Carlos já no primeiro trecho teve que ir me buscar: fiquei paradinha com a Costa Rica lá em baixo e não ousei olhar para ela em momento nenhum. Teses físicas afirmam que o olhar dirigido para baixo aumenta as chances de queda livre. Depois, reconheço, aprendi e não tranquei mais, e o Carlos pôde descansar.

(Arvorismo e nervosismo)
 









No dia seguinte, fizemos um passeio de barco para mergulhar perto de peixinhos coloridos. Golfinhos passaram ao lado do barco, e, no local de mergulho, vimos tubarões fazendo a sesta, nadamos sobre imensos cardumes de peixes azuis. Também amarelos que, mais soltos na vida, nos olham de frente (e fomos todos atacados por pequenas dores queimantes que não entendíamos, porque o bicho queimador não é visível: são micro-medusas. Não sabíamos de sua existência e nem que poderíamos nadar para longe delas.) Curioso ver pessoas encantadas com peixinhos, parentes próximos dos que tiveram em forma de cadáver no prato no almoço de ontem. Para nós, Lin, o condutor rastafari, levou arroz com vegetais e muitas saladas. Na verdade o cardápio de todo mundo foi vegetariano, e comeram lindamente sem notar.

Da praia onde é servido este almoço depois do mergulho, decidimos voltar a pé. Foram oito quilômetros que valeram muito a pena percorrer (vale a pena ler adiante sobre “Valer a pena”.) As trilhas são fáceis, com pouca subida e bons trechos de praia (passa-se pelo rio Claro que pode ser subido de caiaque e barcos a remo conduzidos por pessoas locales – o nome Claro, claro, não é exagero).

(Sil no Rio Claro)




Mas eu temia pegar noite nessa volta e, à noite, sem lanterna, é totalmente impossível prosseguir. Mais perto da Baía, há resorts e hoteis de estrangeiros, aos quais só se chega de barco ou por estas trilhas. Se não tivéssemos conseguido chegar antes de escurecer, este blog não existiria.

(Aqui  posicionados, crocodilos dão ideia do risco que corremos, não fora o fato de a foto ter sido tirada a centenas de quilômetros daqui)
 


  • PARQUE CORCOVADO, PENÍNSULA DE OSA 

 Se a estrada até Drake é ruim, ela fica bem pior segundo mais para o sul, muitos rios a cruzar (daí a utilidade da tração em quatro rodas, pois em alguns casos se sai do rio direto para uma subida íngreme e pedregulhada). Chegamos a Carate, passamos pelo posto de informações, e a estrada ficou impossível. Vimos cães famintos e acampamentos de garimpeiros. Retornamos ao posto para perguntar a distância de Carate, e o funcionário disse que Carate era aquilo ali, não havia outra Carate. É engraçado que conste num mapa o nome de um lugarejo que não tem nada que não um posto de informações, meia dúzia de casas (seriam tantas?) e dois ou três hoteis. Mas, claro, Carate é a entrada do Parque Corcovado.
Um dos hoteis constava de tablados sobre os quais a senhoria instalou barracas de camping com colchões.

Tentamos a outra indicação (dessas que se obtêm quando se vê um senhor molhando a grama na frente da casa), Catappa Bangalôs. Foi a melhor coisa que nos aconteceu. Bangalôs muito integrados ao verde (de baixo quase nem se os avista, ficam camuflados na encosta do morro), as quatro paredes teladas na sua metade superior, a floresta está quase dentro do quarto (Vale a pena subir os mil degraus). Varanda em dois lados da cabana. O gerente, cozinheiro e amigo de antas, Pablo, além de ser muito legal como pessoa, cozinha super bem. Fora nós, os demais convidados pareciam ser amigos. Ele fez um buffet de veganices, cozido de legumes, arroz com vegetais e muitas saladas com favas e aspargos frescos. Quando chegou o último convidado,  sem ter visão do balcão, Pablo indicou que se servisse... só que não. Quem não conhece veganos pensa que pouca coisinha nos satisfaz. Comemos bem e muito e bem e muito, e não deixamos nada.


(Cozinha do Catappe, como várias outras aqui, aberta para a rua)      

A selva passa a noite em conversas com o mar lá embaixo. Antes de clarear, os macacos congos começam a gritar para marcar território. Um congo do nosso lado tentava ganhar no grito do congo mais de longe (quem não sabe da desproporção entre estas vocalizações e o tamanho de seu dono pode ficar aterrorizado).

Infelizmente tínhamos prazo para voltar e por isso não pudemos ficar mais no paraíso das cabanas do Catappa. Nesta viagem, por estarmos acompanhados por uma monera (pessoa que estuda monos, isto é, macacos, e, no caso, os capuchinhos), aprendemos bastante sobre eles. Quer dizer, não aprendemos nada, tão somente que eles têm um esquema de vida cheio de regras sociais e formas de comunicação, como todos os animais mas que nos iam sendo descritos pela nossa especialista à medida que aconteciam na nossa frente. Que buena suerte!


 (Capuchinhos e pesquisadoras)
Moneras em ação no Lomas Barbudal


  • BAGACES, GUANACASTE 

 O roteiro sofreu influência do fato de termos que "devolver" a monera a Bagaces, cidade junto à reserva Lomas Barbudal. Assim que, do Corcovado e paraíso do Catappa, subimos para o norte. Em Bagaces, nos hospedamos na Cabina Tamarindo (do seu Guido), quartos com ar-condicionado, TV e boa cama, estacionamento e internet, por 30 dólares.

(Praça de Bagaces e sorveteria)


Bagaces não está em nenhum roteiro turístico, mas é ótima cidade para se conhecer uma forma de vida costa-riquenha, um certo clima de filme de faroeste. É uma pequena cidade incrustada em zona agropastoril (lá tem o arrroz Tio Pilon e vive o muito desafortunado gado em pecuária – menos mal – extensiva). Bagaces, na província de Guanacaste, próxima a Libéria, tem uma praça central em frente à igreja católica (nada mais óbvio) e ali acontece a vida social da cidade, principalmente no coreto onde se escuta música de bandas quase todo dia na hora do desamparinho. Tem um barzinho transado que se chama Pallo Verde e, claro, algumas sodas. O que mais tem Bagaces? Para nós, uma cidade muito importante, ao menos até julho de 2013. Próxima, fica a reserva Lomas Barbudal, em que os macacos capuchinhos ainda vivem de forma mais natural.

(Casa do projeto Capuchinhos Lomas Barbudal)


  • CASCATA, A SECRETA 


 Nossa cascata secreta tem, entre outros méritos, o fato de ser acarpetada por uma vegetação fofa. No mais, água excelente, sombra na volta do lago e sol na cascata na medida certa para que se deseje a água que despenca fresca e clara. Mas ela fica dentro de uma propriedade privada e quem não gozar de amizade de longa data com o Francisco corre o risco de não entrar, ou se entrar, não a encontrar.

 




  •   TIERRAS ENAMORADAS 


 De Bagaces, voltamos para outra região de montanha, para conhecer um hotel que de certo modo fez jus ao que dele se dizia. Chama-se Tierras Enamoradas ou Lands In Love. Se vai por asfalto, sobe-se a serra com neblina e paisagens incríveis dos dois lados da estrada o tempo todo. Lands in Love é um hotel sofisticado, ocupa uma área de 109 hectares e oferece todas estas atividades que encantam as pessoas, canopy, super-homem, escalada de cachoeira, cavalgada (como assim? Ah, mas nossos cavalos são muito bem tratados...). Chegamos no dia 31 de dezembro e, de felicitações, nos alertaram que não tinham mais serviço de copa. Nos olhamos: alguém perguntou se tinha?
O hotel é vegetariano, e as opções veganas não são nenhuma maravilha. O leite de soja veio num dedal, mas a marca desse hotel me pareceu a antipatia misturada com a falsa simpatia, sendo a primeira infinitamente melhor do que a segunda. Os/as donos/as são israelenses e falam hebraico entre si (tudo bem, mas eu não gostei). O hotel é bonito, sofisticado, super bem cuidado, o entorno de montanhas é muito lindo e, além de vegetarianos, os donos recolhem animais de rua e mantêm um abrigo – o que pode ser bem discutível, assim como os cavalos, o leitinho, etc. As promoções podem ser acompanhadas no Facebook do hotel, que pode ser buscado por Tierras Enamoradas. Nós pagamos 118 dólares pela diária. Mas tudo do que não se precisa na CR é de antipatia e de falta de sol. Se abriu sol no meio da tarde, não ficamos sabendo, porque decidimos descer a serra e nos esquentarmos em todos os sentidos na praia.

(O Tierras é bom de filosofia)
 


  • PENÍNSULA DE NICOYA 


 Se um provável leitor e viajante chegar ao porto de onde parte o ferryboat para Paquete e faltarem quase três horas, espere as três horas. Não repita nossa ideia de ir até Naranjo e fazer o percurso dirigindo. A estrada é a pior do mundo (há algum exagero nisso, mas preciso ser convincente para seu bem e de suas mamas, se as tiver). Ela é larga, mas sinuosa (como todas as pequenas estradas daqui) e cheia de pedregulhos soltos, de maneira que pedregulho-planamos algumas vezes. Se houvesse carros do outro lado, teríamos batido. O bom é que quase não há carros do outro lado - e nem em parte alguma. De fato, chegamos em Paquete às cinco horas (quando estaria saindo o ferryboat da outra margem preparando-se para o trajeto de uma hora e meia por mar) e com isso ganhamos tempo, mas certamente o melhor é se informar do horário e chegar pouco antes, o suficiente para encontrar lugar para o carro e para não ter que passar algum tempo em Puntarenas que é, digamos uma Capão da Canoa, Praia Grande, alguma coisa assim bastante desagradável.

O ferry atende também aos pedestres. Do lado de cima, no forte calor, organizou-se uma quermesse, com a música local, cerveja local e alegria local. Embaixo há um restaurante com ar condicionado, mesas grandes, cartaz implorando para que não se deitem nos bancos e, abaixo dos cartazes, nativos deitados nos bancos. Nada vegano para se comer no ferry, os sanduíches já vêm prontos.

(É favor limpar a mosca do seu monitor)
(


  • PLAYA MONTEZUMA 


Montezuma é uma pequena praia na encosta de um morro, frequentada por europeus. As águas são calmas, algumas praias têm pedras, mas só um idiota não as veria e, portanto, objeção desnecessária. No entorno, há cascatas e riozinhos. Há uma praiazinha de água doce que termina no mar chamada Pedra Colorada (2km de caminhada) e há,enfim, muitas praias boas, e principalmente a principal, ótima para nadar, ótima para ficar à tarde quando tem bastante sombra.
Os estrangeiros dominaram a rede de serviços, mas o lugar de comer de que mais gostamos pertencia a nativos (embora se chamasse Bakery & Café), vegetariano. Tem um centrinho com duas pequenas ruas, bem movimentado, um restaurante bacana que passa filmes alternativos toda noite.

(Turistas esperam  barco para passeio às ilhas e rio que desemboca no mar e, abaixo a Bakery)




  • Hotel Los Mangos 

 Telefonamos pela tarde e confirmamos que havia bangalôs, o preço da diária, 90 dólares. Chegamos à noite, ninguém na portaria, depois alguém na portaria, mas bangalôs, nada de bangalôs. Todos ocupados. Só havia quartos com banheiros compartidos. Na recepção, encontramos Rodrigo, um surfista paulista, cujas reservas, no caso por e-mail para outro hotel, tampouco funcionaram. Ele ficou nos tais quartos e nós fomos para o hotel do lado. A funcionária estava chateada, tentava nos ajudar, mas não sabia muito o que fazer que não dizer nomes de outros hoteis.


  • Hotel La Cascada 

 Não é nenhum sonho de hotel, mas não é impossível, desde que sejam os quartos de cima junto a um grande terraço cheio de redes. Os melhores quartos são os de número 8 a 13, no lado sombreado. O 8, no qual ficamos, tem a vantagem de ter janelas para dois lados, porque é de esquina, e a desvantagem de se ter que eventualmente fazer psiu durante a noite aos hóspedes que não leem o cartaz que diz: local de silêncio após vinte e duas horas. O 13 me parece o melhor dos quartos, por ser o último (fica na sombra, na esquina e não é passagem). O Cascadas tem café da manhã, que Los Mangos não têm (porque transformou o restaurante em salão de yoga, sic), mas não tem a piscina do vizinho. Uma boa vantagem é o preço (60 dólares com desayuno).

Vídeo encontrado no youtube, feito no hotel e com destaque para o narrador que filma um carro e diz: "carro". 


(O melhor do café da manhã é a companhia das duas cachorras, mãe e filha, e o gallo pinto)









  • PLAYA TAMBOR 


 Uma cascata que cai no mar, Cocolito, é uma das atrações que vale a pena, cuja pena não é das piores se a pessoa for de carro até Tambor ou se tiver disposição para caminhar por duas horas pela praia. A cascata é uma curiosidade porque cai diretamente no mar, mas o bom são as praias ao seu redor, inclusive uma de um rio de águas azuis, com o adicional de serem praias desertas. O centro urbano mais próximo é Tambor que tem alguns pequenos hoteis e um resort chamado Tropical. 

 Duas faixas etárias prioritárias são encontradas em Tambor: zero a 11 e depois 60 a 100. Por aí já se vê que estamos falando de águas calmas, mornas, nada para se fazer. Ou seja, a melhor praia que visitamos em toda a Costa Rica. Melhor para nadar impossível. Para dormir, excelente. 

 Nos hospedamos nas Cabines Cristina, atendidas por Cristina e família. Áreas de convivência no térreo ou no terracinho do segundo andar onde ficava nosso espartano quarto (ao preço excelente de 36 dólares). Travesseiro ótimo, cama mais ou menos, e banheiro um tanto desastroso, mas nada que a família não possa melhorar muito com pequenas providências, como substituir o box de plástico que não anda nos trilhos por uma cortina, fixar a pia que dança e dar uma pinturinha nas prateleirinhas. 

 O restaurante da Cristina oferece desayuno e depois reabre para jantar às 17:30. Para almoço há uma soda junto ao camping na beira da praia. Cristina tem um quarto, o de número 1, que é o top, com duas camas de casal, minibar, ar condicionado. Nas cabinas Cristina fomos apresentados ao suco de cas, uma fruta que parece uma goiaba que recebeu promoção pelo acréscimo de tons cítricos. Por que as pousadas não têm todas redes?


(Abaixo, sacadinha da Cabine Cristina, e seu restaurante que fica aberto para a rua, sem seguranças e sem roubos,com freezers e equipamentos de cozinha. Depois, a cascata Cocolito que cai no mar)




  • PLAYA BRASILITO - GUANACASTE






(casal do Texas que fez a volta na Costa Rica na bicicleta dupla)


Depois de Tambor, só poderiam vir decepções, e  Brasilito assim me pareceu, porque é meio confusa como cidade e o pior é que as águas do litoral Pacífico ficam frias à medida que se sobe para Guanacaste.   Ao lado de Brasilito, bastando ultrapassar um morrinho, há a playa Conchal que tem este nome porque, no lugar de areia, tem conchinhas muito claras. A praia afunda rapidamente, também se trata de uma enseada muito bonita e também tem o defeito da água fria, e um pior de todos: é uma praia mais frequentada e então tem venda de coisas, como snorkel e pés de pato, e detestáveis barcos de passeio, até mesmo aquele de incrível mau gosto que atende por banana boat. São bons motivos para se ficar pouco tempo. Outro é que houve uma descompensação de um certo pássaro exótico que grita tanto que parece que se está na Praça da Alfândega em Porto Alegre, onde um carrinho vende CD de gritaria de pássaro.

(Praia Conchal, num ângulo forçado para não incluir pessoas)

 


  • LIBÉRIA

Capital de Guanacaste, parece uma pequena cidade de interior. Não há edifícios, e mesmo as casas térreas são tão baixinhas que parece uma cidade de ficção. Tem sua praça, tem hoteis além de cabinas, mais movimentação e tem um aeroporto internacional bastante decente. O detalhe arquitetônico da cidade são casas com portas de esquina, isto é, uma porta de cada lado da esquina com uma coluna entre ambas. Há ainda muitas casas antigas na cidade e no geral pouco sinal de modernização (uma maravilha).




  • COISAS GERAIS SOBRE A COSTA RICA



  • PRAIAS 


Dizem que, na Costa Rica, deveríamos esquecer as praias e privilegiar as florestas. Não penso assim. Claro que as florestas são maravilhosas.  As praias podem não ter areia branca, mas são limpíssimas (inclusive a areia, porque os frequentadores da Costa Rica não pertencem à tribo dos sujadores, além de a densidade ser muito baixa e, com curtas caminhadas, se reduzir a zero). Há praias para surfistas, como Santa Tereza na Península de Nicoya, e mesmo nestas, basta caminhar um pouco para chegar a algum recanto deserto, com algum rio deserto. Fiquei sempre achando que tinha alguma armadilha nestes rios (lembrando sempre o Guia da Folha de São Paulo e seus alertas) para serem tão bons e pouco frequentados. A água das praias tem a temperatura ideal, dá para nelas se refrescar sem sentir choque térmico na entrada ou saída. Isso não vale para as praias de Guanacaste que são frias. Surfistas teriam muito mais a dizer sobre as praias e tipos de ondas, mas só fomos para aquelas que não servem aos surfistas, e sim aos boiadores como nós. Surfistas encontram sua turma em Santa Tereza, e os que não querem encontrar a turma, mas mais as ondas, vão à Província de Osa.

(Abaixo, uma praia superpovoada e o primeiro encontro com o Pacífico)



  • OBSERVATÓRIO DE ANIMAIS

De tanto ver fauna e flora, o olhar se acostuma e quase esqueço de mencionar que o tempo todo se vêem animais e, em geral, se longe de estradas, eles parecem bem, vivem num lugar que entende que eles são os legítimos donos da Terra. 



  • DISTÂNCIAS 

 As distâncias na CR não são medidas em quilômetros, mas em tempo, o que faz todo sentido, pois, dependendo das condições da estrada, a quilometragem quer dizer muito pouco. Mas se o nativo diz que é uma hora, pode marcar: vai levar uma hora. Na cidade é o contrário. Não dizem duas quadras ou três ruas depois. Cada quarteirão são cem metros. Então eles dirão: “ande trezentos metros, dobre à direita (e erguem a mão esquerda). Confie mais na semiótica do que na linguagem.

  • INTERNET 

Todos os hoteis pelos quais passamos tinham wi-fi.


  • TRATAMENTO PESSOAL 

 Capítulo importante na viagem pela Costa Rica. É de surpreender a extrema cordialidade, a disposição de ajudar. Viajantes são vistos com bons olhos, e então não se tem a sensação de se ser estranho numa terra estranha. Ao contrário, parece que o tempo todo reencontramos nossos vizinhos. Isso se refere aos ticos e ticas, como são conhecidos os nativos, mas de certo modo contagia alguma parcela de turistas e certamente se torna marca dos viajantes. Até de dentro dos carros o cumprimento é obrigatório na parte sul da Costa Rica (não vale o mesmo para o centro e norte porque há mais turistas do que viajantes e moradores). O Guia da Folha de São Paulo diz para não aceitar ajuda de estranhos. Nós aceitamos ajuda de estranhos o tempo todo.

  SODAS 


 Estes pequenos restaurantes em geral são de propriedade de nativos, levam os nomes de suas donas ou cozinheiras, são restaurantes populares espalhados por todo o país. Como somos vegetarianos estritos, nossa alimentação não tem nada de cadáveres e nada de excreções e secreções animais. As sodas são nosso paraíso, porque tem um prato que é típico e perfeito para nós. Chama-se gallo pinto (não tem galo nem pinto, mas arroz e feijão, que uma vez cozinhados, são fritados juntos e muito bem temperados). Gallo pinto é considerado prato de café da manhã e, se no início, achei isso estranho, ao final estava praticamente viciando em gallo pinto às sete da manhã. Nas sodas, também se encontram arroz com vegetais e plátano frito (banana frita), aguacate (abacate) com os quais se substituem os ovos no gallo pinto.


(Vimos muitas cozinhas assim, abertas para a rua)



  • CLIMA-TEMPO 

Montanhas = frio (faz até 11 graus mesmo na estação seca) Praias = calor até de noite, mas nada que um abanico (ventilador) que tem em toda parte não resolva. Na estação seca, há mosquitos, mas não muitos. Mas se somos do tipo de pessoa para a qual basta um mosquito para ter sua noite virada num inferno, então melhor  usar repelente. As janelas em geral são equipadas com telas. Não sei nada do que acontece na estação das chuvas. O triste é que escurece por volta das seis horas. 


 VOLTAGEM 

110. 

  • CABINAS 

 São hoteis simples e eficientes, um modo prático de pernoitar em lugares higiênicos (marca do país é a roupa de cama muito limpa, secada ao sol) e baratos. Como li em algum lugar, as cabinas estão para os hoteis como as sodas para os restaurantes.      

  • ALUGAR CARRO 

 Há como viajar de ônibus para toda parte, mas o relato que tivemos de tais viajantes é que demora muito, perde-se um dia inteiro, além de ter que ouvir as músicas típicas. Sou a favor das músicas típicas, desde que a isso não se refiram, no Brasil, a sertanejo e aqui, a cumbias ou o que quer que seja que se escuta aqui e é sempre igual e ruim. Um carro, portanto, ajuda bastante quando não se tem muito tempo. Nós tínhamos bastante tempo e achamos que o carro ajudou bastante. Alugamos o 4 x 4 mais barato, que é o Jimmy. Vi muitos Jimmys carregando quatro pessoas, mas não sei em que estado ficaram os passageiros de trás. Ele é bom para duas pessoas. Três, sendo a terceira pequena, ainda vão bem. O porta-malas é pequeno e sem tampa, o que complica no que diz respeito à recomendação de nunca deixar pertences à vista. No mais, ele é bem valente e aguenta rios e valetas. Por 18 mil colones, se completa o tanque do Jimmy, o que dá 36 dólares (não sei quantos litros nem qual o preço do litro, mas o leitor se vire com essa informação que já tá bem bacana).



  • MÚSICA 

 Não descobri como é a música autêntica costa-riquenha. Nas rádios toca a insuportável cúmbia (será mesmo aquilo cúmbia?, não tenho certeza), há uns caras falando bobagem (grande novidade) e uma rádio a 99.5 (rádio Los Dos, “exitos que eram de un y agora son de dos”), que é a que pega melhor em toda parte e toca música estadunidense dos anos 80. Na verdade, o pior da música estadunidense dos anos 80 (se é que houve a melhor). Que injustiça: um dia ouvimos o Credence. Ouvindo esta rádio a pessoa pode se especializar em Michael Jackson ou Gloria Gaynor e tudo quanto é bate-estaca do tipo discoteque, Bee Gees e seus primos. 

  • LITERATURA 

 Tampouco descobri se há autores costa-riquenhos para se ler. Gostaria muito que alguém me dissesse.

  • GUIA DA FOLHA DE SÃO PAULO 

Fora os mapas e as informações objetivas, esse guia é anti-guia. Alerta para tantos perigos, que faria qualquer pessoa que não seja masoquista desistir de viajar para a Costa Rica. Só que os assaltos, as arraias venenosas, os sapos assassinos, os crocodilos vampiros, os roubos, os afogamentos não vão acontecer a menos que este leitor se encontre nos honrosos 0,001% de pessoas vítimas de alguma coisa assim e mesmo assim por imprudência. É um país bem seguro. Pode o trânsito merecer algum cuidado na estrada principal (a nossa BR 101) que se chama Panamericana. Mas foi nela que aconteceu o enredo com o policial. E não há qualquer diferença entre o que se vive nas estradas do Brasil. Não fizemos a experiência de deixar malas no carro. Abstraindo-se os alertas, o guia é bastante bom para se conhecer o país por regiões.

  • DINHEIRO 

  •  Dólares são aceitos em toda a parte, embora a conversão nem sempre seja a mesma que se teria num banco. Há hoteis e restaurantes que não aceitam cartões de crédito (naturalmente os mais simples). Assim que o ideal é ter colones e cartão de crédito para casos especiais.

  • SEGURANÇA 

 Segundo o Guia da Folha de São Paulo, é preciso viver obcecado contra roubos na Costa Rica. Nós escolhemos viver obcecados por olhar a paisagem, e achamos uma boa troca.

  • CAFÉ. 

 Os cafés são uma das marcas gastronômicas do país. Dá para fazer as pazes com o café. Minha madrinha nem vai acreditar no tamanho das xícaras de café que andei tomando. Não sei se é isso, mas acho que o sabor substitui a concentração. O café não é forte e é saboroso. Com o leite de soja que encontramos aqui (Soya Pac), pude rememorar os tempos de café com leite de vaca. O leite de soja é muito bom (cheguei a achar que tivesse pó de leite de vaca contrabandeado dentro do saquinho). Assim que cafezão puro ou café com leite de soja fazem parte das boas experiências costa-riquenhas, juntamente com o Gallo Pinto puro. 
(Cafeteira do Hotel Cascada/Montezuma)

  • ESTRADAS

Algumas poucas estradas são pavimentadas, a começar pela principal, a Panamericana. Mas as que não são... O carro tem que ser 4 x 4 e a pessoa usar sutiã. A variedade de pisos é imensa: pedregulhos enormes e soltos, pedregulhos enormes e fixos, pedregulhos médios, valetas, buracos, rios. Em geral as estradas são largas, acho que para se poder derrapar e se aprumar antes de encontrar o barranco ou o penhasco. Isso é apenas uma piadinha, pois, como se anda devagar, ninguém está em risco real nestas estradas, elas são apenas incômodas. Um GPS é bem útil porque as mais interiorizadas não são bem sinalizadas. 

  • SAÍDA DA COSTA RICA 

 Para sair da Costa Rica se paga uma taxa de 28 dólares por pessoa. Sei lá qual a explicação, mas sem pagar não sai. E sem sair, depois de três meses, é a ilegalidade. Que injusto: não basta se ir embora, ainda se tem que pagar.

  • VALER A PENA 

Eu mesma empreguei várias vezes essa expressão, até sem me dar conta da carga semântica. Para que fique claro: valer a pena significa que a pena não é pouca coisa. Para chegar a uma vista estupenda, a uma cascata deslumbrante, ao lugar frequentado por animais incríveis, não basta abrir a porta do quarto e dar alguns passos. Há que suar muito, ter muito medo, ficar muito cansado, passar muito calor ou muito frio, ter muita vontade de estar sentado numa poltrona de cinema, fazer muita promessa para o caso de voltar vivo, fazer muita promessa para aquele ser o último trecho. E enfim quando se chega ao destino, suspira-se e se diz em coro: puxa, vale a pena. Mas se não quiser fazer nada disso e ficar na sacada do hotel ou olhando o país de dentro do carro, já é tudo tão bonito, que até assim visitar a Costa Rica vale, mesmo sem ter pena.